Os grandes industriais e o ministro da Justiça do Brasil acreditam que o contrabando e a pirataria causam grandes prejuízos à sociedade brasileira. Mas será que isso é mesmo verdade?
Poucos dias atrás, foi realizado o seminário “Combate ao Brasil Ilegal”, no qual foi apresentado o relatório “Brasil Ilegal em Números”, produzido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), em conjunto com outras federações relacionadas à área. O evento em questão, que contou com a presença ilustre do ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, foi dedicado ao combate de dois males que, segundo os envolvidos, trariam graves prejuízos ao Brasil: o contrabando e a pirataria.
Segundo dados apresentados pelo citado relatório, o Brasil “perdeu” - entre muitas aspas - R$ 453,5 bilhões apenas em 2022, por conta dessas duas práticas que, de acordo com a lei brasileira, são consideradas crimes. Essa quantia é muito superior, por exemplo, ao PIB de estados como Santa Catarina - levando-se em conta, naturalmente, os números da economia do ano anterior. Conforme os realizadores do tal relatório, o objetivo da CNI e de seus agregados seria muito nobre. Em suas palavras: “Queremos contribuir para que os governos adotem medidas mais rígidas para combater essa ilegalidade, investindo ainda mais em segurança pública em todo o país”. Que grande piada!
Lewandowski, como era de se esperar, fez coro aos idealizadores do evento, afirmando que a questão apresentada “não é um problema só do Estado, é um problema de todos”, e que, portanto, deveria ser enfrentada por todos “de mãos dadas”. Ainda segundo o ex-ministro do STF, o governo brasileiro deve agir não apenas partindo para a porrada contra os muambeiros, mas também atuando nas áreas de inteligência, para impedir que essas práticas continuem vigorando aqui, no Brasil.
Ok, o discurso é esse; mas será que o que foi apontado pela CNI e pelo ministro é realmente pertinente? Afinal de contas, o que o Brasil estaria perdendo com o contrabando e com a pirataria, além da grana já citada? A CNI, é claro, tem a resposta para essa pergunta: o país teria perdido, por conta dessas práticas, 370 mil empregos diretos - isso considerando-se, apenas, o ano de 2022. Só no setor do vestuário, esses ditos crimes representariam 67 mil empregos a menos. Veja só: que malvados são esses contrabandistas, não é mesmo?
Contudo, a maior preocupação revelada no citado relatório, e também nesse seminário, foram os impostos que deixaram de ser recolhidos - estimados em R$ 136 bilhões, também em 2022. Estão sendo considerados, nesse cálculo, tributos destinados à União, aos estados e aos municípios. De acordo com o relatório, e também com as notícias que o repercutiram, isso seria um grande problema, porque esses impostos “poderiam ser revertidos em bem-estar para a sociedade”. Vai vendo!
A essa altura do campeonato, você provavelmente já detectou vários problemas nessa argumentação toda, não é mesmo? Vamos destrinchar esse tema por partes. Em primeiro lugar: o que é contrabando? A definição desse tema é bastante simples: trata-se da venda de mercadorias sem a anuência do estado - um ente que, como sabemos, sempre cobra um arrego para cada transação econômica realizada. Portanto, conforme a definição estatal, se você se recusa a ter parte de seus ganhos mordidos pelo parasita, então você estaria cometendo um verdadeiro crime. Obviamente, isso não procede, uma vez que o contrabando representa uma prática sem vítimas reais. Aliás, só há vítimas quando o estado cobra os impostos!
É claro que o contrabando também pode se referir ao comércio de itens que o estado proíbe; mas isso poderia também ser chamado de “tráfico”, para que a distinção possa ficar bastante clara. Contudo, também neste caso, estamos falando de um crime sem vítima. Mas a conversa sobre o tráfico vai ficar para outro vídeo.
A pirataria, por sua vez, está diretamente relacionada ao conceito de “propriedade intelectual”. Estamos falando, por exemplo, do ato de copiar um modelo de tênis de uma marca famosa - apenas para ficar bem perto da realidade brasileira. É claro que, munidos dessa definição, podemos nos perguntar: por que diabos isso é chamado de pirataria? O que isso tem a ver com bandidos armados sequestrando navios e seus tesouros? Absolutamente nada; acontece que atribuir um nome pejorativo a uma atividade ajuda a transformá-la em crime. Mais uma vez, contudo, estamos falando de um crime sem vítima.
Pois vamos, então, a explicação a respeito do nosso ponto libertário: nenhuma das práticas citadas pode ser considerada crime verdadeiro porque, como já afirmado, elas não têm vítimas. No caso do contrabando, por exemplo, um sujeito adquire mercadorias de determinado lugar, com seu dinheiro, transporta-as em seu veículo, ou contrata alguém para fazê-lo, e revende essas mercadorias em outra parte. O comprador, de forma totalmente livre, escolhe comprar essa mercadoria, por achar o preço mais atraente, ou por qualquer outro motivo que lhe der na telha. Que crime foi cometido em toda essa transação? Pois é: nenhum. Trata-se, apenas, de pessoas pacíficas comercializando entre si.
“Ah, mas esses produtos são vendidos sem nota fiscal, não têm garantia!”. Em primeiro lugar, todo cliente é livre para simplesmente não comprar itens de um vendedor que não lhe forneça algum tipo de garantia. Como diria o meme: não tem garantia; comprou porque quis! E em segundo lugar, garantias podem ser fornecidas por meio de contratos específicos, algo que tornaria a nota fiscal dispensável. Na verdade, esse pedaço de papel serve, apenas, para dar ao estado condições de roubar dinheiro da sociedade - não é para proteger o consumidor!
Quanto à pirataria: para início de conversa, propriedade intelectual não existe - e nós já falamos muito disso, aqui no canal. Ao copiar um item de uma marca famosa, ninguém está diminuindo a propriedade dessa marca. “Ah, mas a marca deixa de ganhar dinheiro”. Isso é logicamente errado! Veja: se você compra, no camelô, um tênis da Nike que deveria custar 800 mangos por R$ 50, você sabe que está levando uma réplica de qualidade consideravelmente inferior. Ou seja: você não está sendo enganado. Agora, se você compra um tênis pelo valor real, mas recebe da loja uma falsificação, então isso representa uma fraude - que é um crime real, mas que é cometido contra o consumidor, e não contra a marca original.
Convenhamos: quando alguém compra um tênis da Nike por 50 reais, a empresa famosa não está perdendo absolutamente nada. A alternativa para esse consumidor não seria comprar um tênis original por R$ 800, mas sim comprar qualquer outro calçado genérico pelos mesmos 50. Afinal de contas, quem quer gastar tanto dinheiro assim num tênis da Nike, vai buscar esse produto numa loja qualificada, e não no camelô muambeiro.
Mas, se não estamos falando de uma prática efetivamente criminosa, por que esse pessoal está fazendo tanto rebuliço, em relação a esse tema? É claro que, aqui, estamos diante de interesses mais do que escusos - a saber: arrecadação, por parte do estado, e retirada de concorrentes menores do caminho, por parte das empresas envolvidas no relatório. Mais uma vez, vamos tratar desse tema por partes.
O governo, volta e meia, está às voltas com problemas de arrecadação. E, nesse sentido, o contrabando e a pirataria representam uma perda de receitas, por parte do estado. É claro, portanto, que o governo não quer apenas criminalizar essa prática - porque isso não resolve muito o problema, de maneira geral. O estado vai além, usando sua mão pesada para agredir o muambeiro. As cenas de policiais batendo de maneira covarde em camelôs e tomando suas mercadorias não me deixam mentir. Não se trata apenas de criminalizar: se trata de bater, para dar o exemplo.
Contudo, a verdade é que o estado brasileiro não precisa de mais dinheiro. Pelo contrário, a sociedade brasileira já é roubada demais pelo seu governo. Apenas no ano passado, o estado tupiniquim assaltou a sociedade em R$ 2,3 trilhões, via tributos! Se o povo ainda não dispõe de “bem-estar”, promovido pelo estado - apenas para usar o jargão da CNI, - não é por falta de dinheiro nas mãos do governo - porque isso tem de sobra.
Agora, veja como o estado é mestre em distorcer a realidade, e em levar as pessoas a aceitar coisas que são decididamente erradas. Praticamente todo mundo entende como certo o governo roubar trilhões de reais, todos os anos, do povo; mas a maioria dos “contribuintes” acha um absurdo que determinados indivíduos pacíficos tentem salvar parte de seu patrimônio, por meio do contrabando e da sonegação! Veja se não é uma verdadeira inversão de valores!
Só que os interesses mesquinhos não se referem apenas ao estado. Também a CNI e seus agregados estão bastante interessados em prejudicar os pequenos comerciantes, para tirar esses competidores do mercado. Para os grandes produtores, é muito interessante colocar imposto em absolutamente tudo, porque eles dão conta de pagar essa conta. Por isso, o grande empresariado sempre vai se aliar ao estado para tentar prejudicar os menores. Não é exatamente isso que os grandes varejistas estão fazendo, ao pressionar o governo para adotar impostos sobre comprinhas online?
Por isso, ao contrário do que pensam o ministro Lewandowski e a CNI, nós, libertários e anarcocapitalistas, não consideramos o contrabando e a pirataria um problema. Pelo contrário, nós tratamos essas práticas não apenas como legítimas, mas também como verdadeiras ações agoristas - formas de o cidadão se proteger da sanha arrecadatória estatal. Por isso, viva o contrabando e a pirataria, que preservam quase R$ 200 bilhões do roubo estatal, todos os anos! E viva o Brasil, que é um dos países que mais consome pitaria virtual no mundo - algo que, definitivamente, deveria ser motivo de orgulho para o brasileiro! O que desejamos, de verdade, é que os grandes empresários parem de buscar a mão pesada do estado, para agir de forma violenta contra os pequenos empreendedores - porque isso não é apenas eticamente errado, como é também moralmente indefensável.
https://www.gov.br/fazenda/pt-br/assuntos/noticias/2024/janeiro/arrecadacao-federal-de-2023-somou-r-2-318-trilhoes
https://www.cnnbrasil.com.br/economia/macroeconomia/lewandowski-diz-que-o-combate-ao-mercado-ilegal-no-pais-e-problema-de-todos/
https://www.tecmundo.com.br/internet/233302-brasil-paises-consome-pirataria-mundo.htm