O custo de transação e a perda de poder de grandes estruturas

Duas teorias em campos distintos parecem explicar o motivo pelo qual grandes entidades sociais estão em acelerada decadência e cada dia aumentam os questionamentos a cerca de suas utilidades práticas.

Digite "Hugo Chávez antes do poder", no YouTube. Procure os vídeos mais antigos... Você encontrará um vídeo de Hugo Chávez antes de assumir o poder, sendo entrevistado, falando sobre o futuro:
-No exterior as pessoas tem medo de você. Você sabe disso, não? (Pergunta o entrevistador)
Ao que Chávez responde não saber porquê. E sorri.
O entrevistador continua: Bom, primeiro... Dizem que não é democrata. Você está disposto a entregar o poder depois de cinco anos?
-“Claro que estou disposto a entregá-lo e não só depois de cinco anos, eu tenho dito que até antes porque nós vamos propor uma reforma constitucional, uma transformação do sistema político para ter uma democracia verdadeira, muito mais autêntica. Se por exemplo eu chego aos dois anos e o resultado é um fiasco, um fracasso, ou eu cometo um delito, um escândalo de corrupção ou algo que justifique a minha saída do poder antes dos cinco anos eu estaria disposto a fazer isso...”
Na etiópia, o imperador Haile Selassie foi deposto em 1974 por um grupo marxista comandado por Mengistu Haile Mariam. O grupo do qual Mengitsu fazia parte, era intitulado “DERG”, uma junta militar comunista que antes da deposição do imperador, rejeitava a ideia de uma oligarquia com luxos e riqueza, enquanto a esmagadora maioria da população se encontrava na miséria. Poucos anos depois da deposição, usufruindo do luxo e da pouca riqueza do país herdada da época do imperador e fazendo uso de extrema violência, o grupo Derg foi responsável por centenas de milhares de mortes, tendo seu líder sofrido diversas acusações de genocídio.
Assim como explicado por Lobaczewsky em sua obra intitulada “Ponerologia: Psicopatas no poder”, o poder absoluto atrai justamente os mais implacáveis e justamente por este motivo, por vezes o regime que sucede uma revolução torna-se mais violento e cruel do que o que estava instalado anteriormente.
As organizações, ainda que surjam sob ideais democráticos e participativos, sofrem da inexorável tendência, à medida que crescem e se consolidam, de formar grupos que virtualmente se transformam em oligarquias. Este fenômeno ocorreria, supostamente, devido à própria natureza humana que tenderia à favorecer a centralização do poder e o fomento de elites dominantes.
A história das oligarquias confunde-se com a própria história da civilização humana. Desde os grupamentos mais antigos de que se têm notícia às cidades-estado gregas passando pelas democracias e repúblicas modernas as oligarquias têm encontrado maneiras de perpetuar seu domínio, como vírus, parasitas dos quais não aprendemos a debelar. Mesmo em regimes aparentemente igualitários, como democracias representativas, as elites exercem significativa influência sobre os processos políticos e decisórios.
A "Lei de Ferro das Oligarquias", teoria desenvolvida pelo sociólogo alemão Robert Michels, concluía que em ações coletivas como organizações políticas e sociais, o poder tendia a se concentrar nas mãos de uma casta, mesmo que estas existissem sobre estruturas aparentemente democráticas. Segundo o autor, á medida que uma organização cresce, torna-se necessário o estabelecimento da burocracia com o intuito de maximizar e garantir sua eficiência, o que levou-o à conclusão de que era inviável deixar nas mãos de indivíduos desorganizados os volumes de decisões diárias que aumentavam de maneira paralela à expansão da firma. Assim, para manter a efetividade da organização, seria inevitável a centralização do poder em um pequeno grupo. Este grupo, conhecido como oligarquia, utilizaria todos os meios disponíveis para preservar e ampliar sua influência.
"Michels atestou que o objetivo oficial da democracia de eliminar o mando da elite é impossível, e que a democracia representativa é uma fachada legitimando o mando de uma elite particular, e que o mando da elite, que ele se refere como oligarquia, é inevitável" (Wikipédia)
Este processo é exacerbado pela inevitável necessidade de delegação em organizações de grande porte. Em muitos casos, a participação direta de centenas de milhares de membros nas decisões torna-se inviável. Tal situação seria influenciada tanto pela limitação tecnológica que dificultaria a interação e o debate em escala ampla, quanto por aspectos psicológicos coletivos, uma vez que o autor argumentou que as pessoas frequentemente sentem a necessidade de orientação. A delegação, contudo, resulta na especialização, o que implica no desenvolvimento de conjuntos distintos de conhecimento, habilidades e recursos entre os líderes, aumentando o hiato em relação aos membros comuns e consolidando sua posição de poder.

Enquanto Michels debruçou-se por demonstrar o crescimento inevitável e a centralização nas organizações de poder, outro autor estudou o processo de crescimento de instituições com fins comerciais. O renomado economista Ronald Coase foi reconhecido por contribuir para a compreensão a cerca do funcionamento das firmas. Em sua obra intitulada "The Nature of the Firm", publicada em 1937, Coase explorou a questão fundamental de por que as empresas existem em vez de todas as transações econômicas ocorrerem através de contratos livres no mercado. Ele argumentou que as firmas surgem como resultado das falhas e custos associados ao uso do mercado para coordenar a produção.
Observe o seguinte caso: Grandes varejistas com grandes estruturas internas adquirem produtos feitos na China e revendem em solo brasileiro. O indivíduo comum, experimentando a ascensão da tecnologia, do transporte, da comunicação, da internet, do acesso à informação, da pesquisa, decide comprar diretamente da China. A mera possibilidade de este indivíduo comprar diretamente de um revendedor que se encontra em outro continente é a expressão prática de como os custos de transação diminuíram aceleradamente na última década. A manutenção da estrutura de uma grande varejista, portanto, não se justifica, uma vez que o custo de mantê-la será transferido diretamente para o preço final do produto. Neste momento essas empresas recorrem ao Leviatã para socorrê-las e criar as distorções necessárias para que, não apenas seu negócio dê lucro, mas, em ultima análise, essa estrutura continue sendo sustentada... Um zumbi que não deveria existir no mercado por que é incapaz de alcançar Eficiência.
Oberserve o segundo caso:
Matéria publicada pela Revista Oeste em Janeiro de 2024: “População gasta 6 milhões para construir ponte que o governo Orçou em R$25 milhões. De forma independente, moradores de uma cidade do interior gaúcho viabilizaram em quatro meses a obra que tinha sido prometida pelo poder público para 2025” Fecha aspas. Quando se fala do Estado, os argumentos adquirem certo peso, porque além dos custos de transação, soma-se o custo do Estado.
"Custos de transação são os gastos que a empresa tem para planejar, elaborar e negociar transações de manutenção das suas atividades ou da captação de recursos. Junto a vários outros tipos de custos que uma organização possui, esses desembolsos ocorrem quando é preciso recorrer ao mercado para obter matérias-primas, equipamentos e serviços."(Custos de transação: o que são e como afetam as finanças. Link nos comentários). Esses custos afetam diretamente a eficiência e a rentabilidade das transações e se tornam fator importante na decisão de realizar ou não uma transação.
Antes da invenção da geladeira, como explica o artigo "Sobre gelos e sorvetes no século 19, ou sobre como o capital cria novas necessidades" (link nos comentários) da página Brasil de Fato, os custos elevados associados à aquisição do gelo eram uma realidade com a qual as pessoas frequentemente se confrontavam. O transporte do gelo representava uma parcela significativa desses custos, pois implicava a sua extração de fontes naturais, como lagos congelados e seu transporte para áreas urbanas e rurais. Essa complexa logística envolvia o corte e o carregamento de grandes blocos de gelo em trens ou barcos refrigerados utilizados para transporte por centenas de quilômetros até seus destinos. Soma-se isto ao fato de que o gelo possui uma vida útil breve, o que exigia seu consumo rápido e criterioso armazenamento sob condições que evitassem a fusão. Estes desafios logísticos e de armazenamento inflacionavam os custos do gelo, tornando-o um recurso dispendioso e, portanto, acessível apenas àqueles com meios financeiros para arcar com tais despesas, restringindo seu uso principalmente a aplicações comerciais e industriais. A invenção da geladeira transformou essa dinâmica ao oferecer um método mais acessível e conveniente para o armazenamento de alimentos, eliminando a necessidade do gelo como agente refrigerante, democratizando o acesso à refrigeração.
A expansão das empresas foi abordada por Coase ao propor que elas crescem quando é mais econômico racionalizar os custos de transação de um produto específico internamente, no lugar de indivíduos adquiri-los diretamente no mercado. A existência da empresa, neste prisma, se justificaria porque estes entes internalizam certas transações que, se realizadas no mercado, seriam mais dispendiosas devido aos custos de transação, como no exemplo do gelo. Portanto, o tamanho e a estrutura das empresas são diretamente influenciados não apenas pelo custo do produto em si, como pelos custos de transação e pela busca pela eficiência na coordenação das atividades produtivas.
A consequência lógica extraída a partir daí é a de que em um ambiente de baixos custos de transação, as organizações tendem a diminuir de tamanho. Isso ocorre porque, com custos de transação reduzidos é mais eficiente coordenar atividades econômicas por meio de contratos diretamente no mercado do que internamente dentro de uma organização burocrática e hierárquica.
As tecnologias, as redes sociais e a informação descentralizada estão minimizando também a necessidade de delegação de decisões por que instrumentaliza o debate colocando todos no mesmo palanque, o que reduz a necessidade de burocratização e grandes hierarquias, como haviam até algumas décadas atrás e que servia de justificava para a existência de grupo centralizadores.
Observe que, vendo seu papel ruir, não seria razoável esperar que estas entidades sociais não manifestem seu descontentamento mirando todos seus esforços em manter o status quo onde seus direcionamentos, que por acaso convergem com seus interesses, sejam o direcionamento tomado e aceito pelas massas. Isto parece explicar o momento vivenciado pela democracia brasileira, sendo desta vez, a oligarquia formada por uma casta de funcionários públicos de alto escalão, parte da justiça, políticos e os principais meios de comunicação mainstream, todos partindo da mesma constatação: a sua perda de relevância e poder. Diz um antigo adágio que um animal acuado ataca. Parece estar acontecendo justamente isso, daí a luta contra a liberdade, sendo na verdade uma luta contra a perda da capacidade em ditar os rumos da sociedade.

Enquanto Michels demonstrou a inexorável tendência de oligarquias se perpetuarem no poder, Coase demonstrou que a redução dos custos transversais, isto é, de transação, impelem toda estrutura hierárquica que busca eficiência à se reduzir. Óbvio, a eficiência jamais será objetivo do Estado, senão o de expropriar o máximo de quem produz riqueza sob o pretexto de distribuir e investir na suposta condição de tornar a vida de todos melhor. Torna-se cada vez mais flagrante a sua ineficiência, em uma relação diretamente proporcional à redução dos custos, à democratização da informação e da tecnologia.

À época de Ronald Case era correto afirmar que seria custoso celebrar numerosos contratos para cada transação de troca, o que justificava a existência de firmas e organizações que cresceriam enquanto o custo de transação se mantivesse alto. Hoje, contudo, esta afirmação perde força diante da capacidade que os indivíduos adquiriram de realizar livres tocas entre si, apoiados pela tecnologia e pela informação descentralizada e distribuída. O mesmo processo de corrosão de grandes estruturas hierárquicas e burocráticas pode ser explicado pelo mesmo evento: A redução dos custos de transação. A máquina pública, administradoras de regimes espalhados por todos os continentes estão vendo ruir sua capacidade de domínio sobre a população, entre outros fatores, pela constatação óbvia de que estão se tornando cada vez mais desnecessários. Sem motivos para existir e sema justificativa utilizada para e expropriação da sua população, eles se tornam cada vez mais controladores e violentos, zumbis agonizantes que insistem na narrativa de sua utilidade, enquanto a tecnologia e a informação funcionam como uma adaga cortando lentamente suas entranhas.

A conclusão que tiramos do que foi exposto é a de que a mitigação do efeito da "Lei de ferro das oligarquias" é um efeito que se processa não apenas pela atuação direta da população contra os regimes, mas a própria informação descentralizada e a redução dos custos de transação tornam essas estruturas cada vez mais desacreditadas, inviáveis e desnecessárias.

Felizmente, aos poucos as pessoas estão se dando conta do quão desnecessário é o Estado, e como as soluções estatais para problemas são sempre pior que o próprio problema.

Referências:

https://youtu.be/eWiuEk_N5aQ?si=TzxhoiYPfBM7QW7w

https://www.brasildefato.com.br/2019/11/01/sobre-gelos-e-sorvetes-no-seculo-xix-ou-sobre-como-o-capital-cria-novas-necessidades

https://pt.wikipedia.org/wiki/Lei_de_ferro_da_oligarquia#:~:text=Ele%20alega%20que%20o%20mando,t%C3%A1ticas%20e%20t%C3%A9cnicas%20da%20organiza%C3%A7%C3%A3o.

https://pt.wikipedia.org/wiki/Ronald_Coase

https://pt.wikipedia.org/wiki/Teoria_da_firma

https://www.migalhas.com.br/depeso/262312/brasil--custos-de-transacao-e-inseguranca-juridica--causas-e-consequencias

https://capitalresearch.com.br/blog/custos-de-transacao/