O que a herança obsoleta de 32 milhões de cruzados nos ensina sobre dinheiro.

Homem acha a mala de seu falecido pai com 32 milhões de cruzados. O dinheiro não vale mais nada, e esse é o mesmo destino de toda moeda estatal.

O técnico de manutenção Waloar Pereira Magalhães encontrou 32 milhões de cruzados nos pertences de seu falecido pai. Naturalmente, a quantia não tem mais valor como moeda de troca, já que o cruzado parou de circular no Brasil em 1989. Essa foi a moeda nacional durante breves 3 anos. Naquela época, o Brasil convivia com a hiperinflação e os governos trocavam de moeda frequentemente, em falhas tentativas de conter a situação. Waloar ainda tem esperança de conseguir algum ganho vendendo as notas e moedas para colecionadores, mas certamente nada que chegue perto do valor passado de milhões. As notas valem pouco para colecionadores, pois são fáceis de se encontrar. Há abundância de notas, já que na época da hiperinflação eram impressas quantidades colossais de dinheiro.
O pai de Waloar mantinha o dinheiro em casa, porque não confiava em bancos. Sua preocupação de modo algum era infundada. Inclusive, no ano seguinte ao fim do cruzado, em 1990, o presidente Collor congelou a poupança de todos os brasileiros. Foi uma das maiores afrontas à propriedade privada que o país já viu. Além disso, até hoje vemos como o congelamento de contas bancárias e até o confisco de patrimônio são usados como perseguição política. Foi o caso do famoso youtuber Monark, que começou a criticar certas figuras poderosas que se veem num pedestal acima da lei. Não demorou para o todo-poderoso lorde Voldemort encontrar algum pretexto para congelar sua conta bancária e dar-lhe uma carecada de 300 mil reais. Apesar dessas questões, manter o dinheiro no banco pode ser preferível em muitos casos. Afinal, autocustódia de dinheiro envolve questões de segurança e cuidados para garantir o valor da grana ao longo do tempo e pensar a sucessão para a próxima geração. O pai de Waloar não planejou todas essas questões, mas pelo menos o Fernando Collor não roubou sua grana.
Essa história ilustra como o dinheiro que estamos acostumados, criado pelo estado, é algo completamente artificial. O governo pode, numa canetada, cortar zeros do dinheiro ou mudar a moeda corrente. Também podemos constatar esta artificialidade em moedas comemorativas, como a moeda de 1 real das olimpíadas do Rio de Janeiro, ou a nota de zero euros. Ambos dinheiros contêm valor real diferente do valor facial. Ou seja, a moeda de 1 real das olimpíadas pode ser comprada por cerca de 40 reais, enquanto a nota de zero euros pode ser comprada por cerca de 5 euros. Antigamente, quando a humanidade usava moedas de ouro, isso não acontecia. A moeda até podia estampar algum valor, para facilitar a identificação. Mas ela continha de fato certa quantidade de ouro, que podia ser pesada e verificada. Nenhum governante tinha o poder de dizer que tal moeda de ouro deveria valer qualquer valor arbitrário. Um grama de ouro é sempre um grama de ouro.
Vamos nos aprofundar mais no significado do dinheiro. Por essência, dinheiro é uma mercadoria como qualquer outra, que acaba se tornando o papel de dinheiro pela interação natural entre seres humanos. Por exemplo, pense que você está numa sociedade antiga e acabou de ganhar maçãs como pagamento por arar uma terra. Você não quer comer todas as maçãs agora, e sabe que elas vão estragar em poucos dias. Então, você tem a ideia de ir ao mercado e trocar maçãs por sal. Afinal, você pode guardar o sal por mais tempo, e no futuro trocar por algum outro objeto de seu interesse. O sal também é uma boa escolha por ser divisível. Você pode trocar 1kg de sal de uma só vez, ou então dividir em quantidades menores, como em 10 sacos de 100 gramas, e poder realizar várias trocas. De fato, o sal foi utilizado como dinheiro na história da humanidade.
O dinheiro não apenas surge naturalmente em uma sociedade, como também é uma condição necessária para que ela se desenvolva. Sem dinheiro, uma sociedade não pode avançar de um estágio primitivo para outro mais desenvolvido economicamente. É comum ouvirmos que o dinheiro é o mal do mundo, mas, na verdade, ele é apenas uma ferramenta. Podemos até concordar que o materialismo excessivo seja um mal da sociedade moderna, o que podemos perceber ao nosso redor como um problema real. Mas o dinheiro, por si só, é uma ferramenta essencial para que a humanidade, aliada a uma economia de mercado capitalista, possibilite que as pessoas vivam em condições minimamente dignas. Com certeza, o capitalismo, desde a Revolução Industrial, já reduziu a miséria no mundo em uma escala nunca antes vista.

Diversas formas de dinheiro já foram usadas na história. Para uma mercadoria ser boa para servir de dinheiro, ela precisa ser fácil de armazenar e transportar. Além disso, ela precisa ser divisível, para que se possa definir qualquer valor em uma compra ou venda. E mais importante de tudo, ela precisa manter o valor ao longo do tempo. Por exemplo, o ferro não é um bom material para dinheiro, já que ele enferruja em contato com a água e o oxigênio. Não deve ser nada legal ver as suas economias enferrujando e sumindo.
Além da degradação do material, há outra forma de uma moeda perder valor ao longo do tempo: a diluição da moeda. Em outras palavras: a inflação. Ela acontece quando mais unidades de alguma moeda são adicionadas ao mercado sem um aumento correspondente na riqueza real, como bens e serviços. Um exemplo histórico interessante é o evento conhecido como Revolução dos Preços. Com a extração de ouro e prata das recém descobertas Américas, a quantidade de metais aumentou largamente no mercado europeu. Nessa época, chegavam nos portos europeus cerca de 96.600 quilos de prata e 1.583 quilos de ouro por ano. Isso fez com que, ao longo de 150 anos, os preços sextuplicassem. Se analisarmos bem, não foram as coisas que ficaram mais caras, mas a moeda que passou a valer menos. Se você tivesse, por exemplo, uma reserva de prata ou de ouro, veria o seu patrimônio desvalorizar com a chegada de novos carregamentos de metais. Assim como qualquer mercadoria, as moedas também estão sujeitas à oferta e demanda. Quando aumenta a oferta, o preço cai.
Podemos perceber, então, que para uma moeda ser boa e manter seu valor ao longo do tempo, ela precisa ser escassa. Apesar desse caso atípico do século XVI, o ouro continua sendo um bom dinheiro até hoje. A quantidade extraída de ouro por ano é pequena em relação à quantidade total disponível. É uma característica do planeta Terra ter pouco ouro em sua crosta terrestre. Outro dinheiro de qualidade é o Bitcoin, que foi inventado exatamente com esse intuito. Em alguns sentidos ele imita o funcionamento do ouro, tanto que o esforço de criar novos satoshinhos se chama mineração. Poucos Bitcoins são minerados por ano em relação à oferta total, o que mantém sempre seu valor para quem os possui. Inclusive, pela forma que a tecnologia foi projetada, a recompensa do minerador vai diminuindo com o tempo, e daqui a algumas décadas, chegará a zero. Quando chegarmos lá, nenhum novo Bitcoin poderá ser criado.
Com todo esse contexto, podemos perceber como a moeda estatal é uma péssima moeda. Quem diria que as nossas simpáticas notas coloridas de Real, com animais da nossa fauna, na verdade, são algo artificial e sem sentido. Não só o governo pode decretar do dia para a noite que o Real não vale mais nada, como ele pode injetar novos reais no mercado e desvalorizar as poupanças de todo mundo. Isso mesmo, o governo tem uma gráfica chamada Casa da Moeda, que funciona como uma mina infinita de reais. A única coisa que impede o governo de sair imprimindo dinheiro loucamente são algumas regras do próprio governo, que sabemos que não são tão confiáveis assim. O Brasil é o país da insegurança jurídica, da corrupção e do jeitinho brasileiro. Ainda mais agora que um corrupto descondenado colocou seu capacho, Gabriel Galípolo, como presidente do Banco Central e seu mandato se iniciará no ano de 2025.
Se o dinheiro estatal é tão ruim, por que diacho continuamos usando ele? A resposta é muito simples: somos obrigados. O nome disso é curso forçado da moeda. O leviatã tem o monopólio da violência e ele cria as regras que quiser. Mas o ouro digital, o famoso Bitcoin, que é totalmente descentralizado, está aí para acabar com a farra da inflação das moedas fiduciárias e do controle centralizada do estado.
O governo não impõe esse curso forçado sem motivos. O curso forçado da moeda é uma das principais formas de controle da população. Se todo mundo usa a moeda do estado, fica muito mais fácil verificar se os impostos estão sendo extorquidos da população com sucesso, e fica mais fácil para a elite enriquecer via criação de novo dinheiro. O estado quer ter o controle da impressora. Se ele torrar dinheiro irresponsavelmente, ele não precisa criar a medida impopular de aumentar os impostos. Ele pode sorrateiramente imprimir mais dinheiro para pagar, por exemplo, suas dívidas e também beneficiar os amigos do rei com crédito. Consequentemente, a população no futuro vai sofrer com a inflação. Mas aí é só jogar a culpa no capitalismo, imperialismo, ou algum bode expiatório qualquer, e seguir a vida.
Por isso que é mais urgente que o governo corte gastos do que baixe impostos. Se o governo cortar gastos, depois é fácil baixar impostos. Mas se o governo continuar torrando dinheiro, ele vai ter que cobrir o rombo de alguma forma. Vai ser via impostos ou via inflação. Não tem para onde correr. No fim dessa farra, nossos filhos e netos estarão cada vez mais endividados e miseráveis. Devido a isso o Brasil é conhecido pelo país da década perdida, toda década o país permanece estagnado economicamente e nunca se desenvolve. Temos um governo que cria muitas burocracias, instituições inúteis a serem bancadas com o dinheiro público, fecha o mercado e cria subsídios para empresas nacionais, e ainda trata o empreendedor com se fosse bandido. Tem como isso dar certo?
Portanto, usar dinheiro de verdade vai além de proteger seu patrimônio. Esta é uma das maiores ferramentas de liberdade. O governo perde uma das maiores armas de opressão quando a população usa a moeda que quiser. Nos tempos atuais, o Bitcoin é a melhor opção de moeda forte, pois ele é digital, livre de controle centralizado e pode ser transacionado à distância, sem fronteiras. Ele é fácil de armazenar, pois é só informação, ou seja, você só precisa guardar suas chaves privadas para não perder o acesso aos seus satoshis. E é mais difícil do governo confiscar. A boa notícia é que a moeda estatal tende a se desvalorizar tanto com o tempo, que naturalmente as pessoas vão migrar para o famoso ouro digital. Se isso de fato acontecer, quem comprar agora, vai se dar bem, da mesma forma que quem comprou Bitcoin há muitos anos enriqueceu bastante. Ao contrário do pobre rapaz que perdeu uma fortuna em cruzados, seus herdeiros vão agradecer os Bitcoins no seu patrimônio.


Referências:

https://www.maioresemelhores.com/moedas-das-olimpiadas/
https://br.ign.com/historia/126246/news/nova-nota-de-zero-euros-entrara-em-circulacao-em-breve-entenda-para-que-servem-e-como-consegui-las
https://economia.uol.com.br/noticias/bbc/2020/03/17/entre-infartos-falencias-e-suicidios-os-30-anos-do-confisco-da-poupanca.htm
https://g1.globo.com/politica/noticia/2023/08/02/moraes-multa-influencer-monark-em-r-300-mil-e-abre-inquerito.ghtml
https://pt.wikipedia.org/wiki/Revolu%C3%A7%C3%A3o_dos_pre%C3%A7os